Canções do Grande Sertão: Veredas

ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. 19. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.


“A saudade que me dependeu foi de Otacília. Moça que dava amor por mim, existia nas Serras dos Gerais – Buritis Altos, cabeceira de vereda – na Fazenda Santa Catarina. Me airei nela, como a diguice duma música, outra água eu provava. Otacília, ela queria viver ou morrer comigo – que a gente se casasse. Saudade se susteve curta” (2001, p. 68).

Canção para Otacília, por Riobaldo

Buriti, minha palmeira,
lá na vereda de lá
casinha da banda esquerda,
olhos de onda do mar...


“Presumi que estavam muito contentes de ganhar o repouso de horas, pois tinham navegado na sela a noite toda. Um falou mais alto, aquilo era bonito e sem tino: – “Siruiz, cadê a moça virgem?” Largamos a estrada, no capim molhado meus pés se lavavam. Algum, aquele Siruiz, cantou, palavras diversas, para mim a toada toda estranha” (2001, p. 135).

Canção enigmática, por Siruiz

Urubu é vila alta,
mais idosa do sertão:
padroeira, minha vida –
vim de lá, volto mais não...
Vim de lá, volto mais não?...

Corro os dias nesses verdes,
meu boi mocho baetão:
buriti –água azulada,
carnaúba – sal do chão...

Remanso de rio largo,
viola da solidão:
quando vou pr'a dar batalha, 
convido meu coração...


“A virar o ar, viemos; em caminho não se descansou um dia. Agora eram os brejos da beira do Paracatu. Mas eu tinha conseguido encher em mim causas enormes. Dispor do rôr daquilo eu não conciliava, conforme perseguia, custoso, vermelho meu. Somente quis, nem podia dizer aos outros o que queria, somente então uns versos dei, que se puxaram, os meus, seguintes” (2001, p. 479).

Canção para exorcisar o inconciliável, por Riobaldo

Hei-de às armas, fechei trato
nas veredas com o Cão.
Hei-de amor em seus destinos
conforme o sim pelo não.

Em tempo de vaquejada
todo gado é barbatão:
deu doideira na boiada
soltaram o Rei do Sertão...

Travessia dos Gerais
tudo com armas na mão...
O Sertão é a sombra minha
e o rei dele é Capitão!...




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